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23 set 2021

Dependência digital já é epidemia? Como orientar crianças e seus pais.

Autora convidada: Adriana Fóz
Dependência digital já é epidemia? Como orientar crianças e seus pais.


 

Você já ouviu falar em nomofobia? A síndrome da dependência digital, o medo irracional e incontrolável de ficar sem celular, sem aparelhos eletrônicos ou sem acesso digital, de modo geral, recebe o nome de Nomofobia. Esta síndrome é descrita pelo CID, que é a Classificação Internacional de Doenças que foi lançada on-line em 2018 pela Organização Mundial da Saúde (World Health Organization -WHO). É uma espécie de manual altamente confiável sobre doenças mentais e é uma base sólida para identificar tendências e estatísticas em saúde mental, em todo o mundo. Está em sua décima primeira versão (CID 11) onde inclui como doença, o uso abusivo de jogos eletrônicos e outras tecnologias digitais. Quanto maior a dependência, maior a fobia.

Também a OMS (Organização Mundial de Saúde) define a adicção ou vício como doença ou seja, a dependência digital, a nomofobia classificadas como patologias, mas por serem resultado de mudanças e avanços tecnológicos, muitos nem conhecem tal terminologia: non mobile phobia. Recentemente foram incluídos em estudos e pesquisas, mas com suficientes resultados e evidências científicas ao lado de outras, como as adicções às substâncias estimulantes (cocaína), euforizantes (ecstasy), sedativas (ansiolíticos) ou alucinógenas (cogumelos mágicos). Importante acrescentar que há uma outra classificação nosológica, ou ainda, classificação de doenças na área da psiquiatria, a Classificação Francesa dos Transtornos Mentais da Criança e Adolescente (CFTMEA, em francês), que também identifica tais comportamentos nocivos.

O Guia Saúde da criança e do adolescente na era digital, lançado em 2016 é um bom material para se ter mais informações, principalmente quanto às interferências e mudanças no desenvolvimento infanto-juvenil que deixa de ser saudável (5).

Mas o que é excessivo? Qual o limite?

Espero não frustrar você, leitor, mas em termos de evidência científica ainda não há um substrato comum entre os estudos e estes não são tão conclusivos quanto as correspondências entre tempo de uso e danos.

No entanto sabemos que os jogos eletrônicos, assim como o uso da internet ou o uso excessivo de celular acabam trazendo problemas com o sono, impulsividade, aumento de ansiedade, depressão, agressividade, violência, intolerância às frustrações, dentre outros.

O imediatismo, a necessidade de terem tudo “num clic”, a falta de paciência é uma característica destes usuários que por si só não é promotor de seus desenvolvimentos, o qual é inerente o tempo, processos e compensações. Este culto à velocidade das coisas e informações está contribuindo para crianças e jovens imediatistas e com menor tolerância à frustração. (FÓZ A. 2019)

Já conhecemos muito como o cérebro de uma criança amadurece e se desenvolve, logo podemos fazer uso de nossas intuições, informações confiáveis e bom senso.

Refletir, pensar sobre o que uma criança perde enquanto está olhando para as telas, o quanto fica desnorteada quando não tem uma tecla para clicar, são dicas. O número crescente de crianças obesas, aumento de problemas psiquiátricos na infância, também são outras observações evidentes que valem a pena colocar atenção.

Abaixo coloco o que já foi bastante divulgado, que são as diretrizes da Associação Americana de Pediatria (AAP), as quais você pode encontrar na BBC News(1)*:

• Para crianças com menos de 18 meses, evite qualquer uso de tela além de chamadas de vídeo;

• Pais de crianças com idades entre 18 e 24 meses que desejam introduzir o uso de mídias digitais devem escolher uma programação de qualidade e assistir junto com seus filhos para ajudá-los a entender o que estão vendo;

• Para crianças de 2 a 5 anos, o uso de telas deve ser limitado a uma hora por dia e a programas de qualidade. Os pais devem assistir com os filhos;

• Para crianças de 6 anos ou mais, imponha limites consistentes, garantindo que o tempo de tela não atrapalhe o sono e a atividade física.

Instituições de pesquisa nacionais e internacionais são unânimes em alegar que o uso deve ser sempre supervisionado, bem como deve ser evitado o uso excessivo e prolongado, assim como podemos encontrar depoimentos da Sociedade Brasileira de Pediatria.(5).

  • Crianças menores de 2 anos: não deve ser usado;
  • Crianças entre 2 e 5 anos: até 1 hora por dia;
  • Crianças entre 6 e 10 anos: até 2 horas por dia;
  • Adolescentes entre 11 e 18 anos: até 3 horas por dia, nunca “virar a noite”;
  • Todas as faixas etárias: nada de telas durante as refeições e desconectar entre 1 a 2 horas antes de dormir.

Cada família tem suas escolhas e dinâmicas e também precisamos ter em mente que possíveis reflexos ou danos do excesso de exposição não serão percebidos tão imediatamente, já que o cérebro infanto-juvenil está em processo de transformação e precisa de prioridades para se desenvolver em sua melhor potência.

E é também inevitável aceitarmos que a tecnologia digital veio para não voltar- dados da pesquisa TIC Kiks Online (2018), realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), mostrou que 86% das crianças e adolescentes brasileiros, entre 9 e 17 anos, estão conectados-, portanto é necessário saber lidar e usá-la para o melhor. Já dizia Paracelso, inquestionável médico do séc. XVI, “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”.

Sugiro então aqui um modo de “dosagem”, uma maneira razoável de mobilizar os pais de crianças para possíveis sinais de alerta, baseado no RCPCH (Royal College of Paediatrics and Child Health) (1) e em outros. Aconselhando os pais e responsáveis a se questionarem:

• O tempo de tela na sua casa é controlado?

• O uso de telas interfere no que a família quer fazer?

• Seu filho tem dormido bem e o suficiente? E seu humor, tem alterado?

• Você consegue controlar o que a criança come durante o tempo de uso de tela?

• A criança deixa de comer o que gosta para jogar ou usar o eletrônico?

• Seu filho tem trocado constantemente as relações pessoais pelas digitais, evitando as primeiras?

• Deixa de fazer outras coisas que se divertia só para usar o eletrônico?

• Já mentiu para encobrir o uso de eletrônicos? Ou tenta disfarçar que usa?

Tais questionamentos são mais efetivos do que colocar uma idade limite ou tempo limite para cada faixa etária, por incrível que pareça!

Inclusive para aqueles que são relutantes ao uso e se utilizam da informação que faz mal para os olhos, isso não é uma verdade científica. Então não a utilizem para convencer seus filhos, pois se eles aprenderam a usar a informação digital com mais competência vão saber que a Academia Americana de Oftalmologia alega que olhar direto para as telas não causa dano, mais pode ocasionar vista cansada ou a síndrome do olho seco, que se reverte com colírio lubrificante.

Se quiser ter algum êxito com os filhos busque acordos familiares e sejam bons exemplos, do contrário causarão mais estresse e pior, a legitimidade da autoridade paternal tão necessária e importante, será “deletada” pelos filhos. (fonte: pediatra Daniel Becker). Este é um preço ainda mais alto que todos pagarão, neste caso.

Por outro lado, toda criança que pode estar exagerando na relação com os aparelhos e mundo digitais, pode ter pais que exageram.

Infelizmente ainda não encontramos um estudo que avaliasse a eficácia de qualquer tipo de intervenção terapêutica para jogadores adultos com sérios problemas de vício de jogos eletrônicos e também para crianças. Mas há indícios de algumas formas de intervenção, como terapia de apoio e de aconselhamento, terapia familiar, terapia cognitivo-comportamental. Outras técnicas como neurofeedback e terapia com óculos 3D precisam ser mais estudados. Para escolher o terapeuta ou a terapia ouça o profissional, peça exemplos, indicações confiáveis, e observe o que seu filho fala ou expressa sobre o mesmo. Pergunte, tire suas dúvidas e conte com sua intuição e conhecimentos.

E também é preciso dizer que os adictos apresentam formas aumentadas de vulnerabilidade enquanto indivíduo e costumam apresentar baixa tolerância à frustração, alta esquiva ao dano, ansiedade acima do normal e baixa autoestima.

Mencionamos os aspectos emocionais e psíquicos, mas não posso deixar de falar dos aspectos cognitivos, como a atenção, memória, flexibilidade mental, dentre outros que são impactados

Vamos evitar que a síndrome nomofobia seja uma epidemia, mas que seja um alerta e um ampliar de consciência dos adultos em prol da saúde e bem-estar de seus filhos e crianças.

 

 

 

 

Texto baseado no artigo” Nomofobia - Meu filho é viciado em eletrônicos?” alocado no neuroblog da Neuroconecte, e do sit A Escola Legal, escrito por Adriana Fóz.
https://neuroconecte.com.br/nomofobia-dependencia-digital/
https://aescolalegal.com.br/nomofobia-filhos-viciados-em-eletronicos/

 

Referências:
 

1. ROBERTS, M. BBC News. Celular e tablets para crianças: passar muito tempo usando eletrônicos pode prejudicar desenvolvimento, janeiro de 2019.

Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-47036386

 

2- Blog Psicologia viva. O que é nomofobia? Entenda sobre a síndrome da dependência digital, julho de 2018.

Disponível em: https://blog.psicologiaviva.com.br/dependencia-digital/

 

3- LIMA, R. C. Estilos da Clínica, 2019, V. 24, nº 1, p. 173-177
DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v24i1p173-177

 

4- ABREU, C. N. e cols . Rev Bras Psiquiatr. 2008;30(2):156-67. Dependência de Internet e de jogos eletrônicos: uma revisão.
https://doi.org/10.1590/S1516-44462008000200014

 

5- Sociedade Brasileira de Pediatria.O Guia Saúde da criança e adolescente na era digital,2016 (revisado em 2020).
disponível em: https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/sbp-atualiza-recomendacoes-sobre-saude-de-criancas-e-adolescentes-na-era-digital/

 

6- FÓZ, A. Frustração – Como treinar suas competências emocionais para enfrentar os desafios da vida pessoal e profissional. São Paulo: Benvirá, 2019.

 

*Contudo, a Sociedade Canadense de Pediatria é ainda mais diretiva: não se deve usar nenhum eletrônico antes dos 2 anos de idade (1).

 

 

 

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