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07 jul 2023

O desafio do trabalho escolar para a recomposição da aprendizagem

Sandra Andrade Scapin
O desafio do trabalho escolar para a recomposição da aprendizagem
Os impactos na aprendizagem após a pandemia precisam ser trabalhados com urgência para que possamos desenhar um novo painel educativo

Não há dúvidas de que a pandemia estabeleceu uma ruptura significativa no processo de aprendizagem de todos os estudantes brasileiros, nos diferentes níveis de ensino, nas diferentes classes sociais.

Sabemos que o Brasil foi o 2º país da América do Sul e o 4º do mundo que, por mais tempo, manteve as escolas fechadas, nos dois anos e meio da pandemia, segundo a OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.

Agora estamos diante de um desafio imenso! Precisamos estabelecer uma força tarefa para construir um novo cenário de aprendizagens efetivas e significativas e este desafio envolve todos nós, professores, gestores das escolas, secretários da educação e o governo em geral que ao iniciar uma nova gestão nos estados e no governo federal, em 2023, devem desenvolver uma política efetiva que reverta este cenário.

Penso que se faz necessário não só atender às questões ligadas à aprendizagem, mas também trabalharmos como o desenvolvimento socioemocional de alunos e docentes a fim de garantirmos também o desenvolvimento da qualidade de vida, do bem-estar e da saúde mental de ambos, mas este aspecto será assunto para outro artigo. Hoje meu foco é a recomposição das aprendizagens.

Então vamos lá! Comecemos revendo como o aluno aprende de uma forma bem breve!

Sabemos que a aprendizagem é um processo bastante complexo que acontece ao longo da vida e é enriquecido a partir de diferentes estímulos, a partir de experiências vividas que favorecem as sinapses que criam, fortalecem e modificam as conexões neurais, graças à plasticidade cerebral.

Assim, é fundamental que, ao organizarmos nossos planejamentos, possamos adotar estratégias diversificadas de trabalho para ampliar a variedade de estímulos e, assim, desenvolvermos diferentes habilidades e competências.

Neste processo de escolha das experiências de aprendizagem, nós educadores, não podemos nos esquecer de que os estímulos oferecidos geram alterações neurais que, ao passar pelo filtro da atenção criam memórias de curto prazo, a chamada memória de trabalho. Estas memórias, durante o sono, se transformam em memórias de longo prazo, e daí a importância de orientarmos as famílias quanto a importância do sono para crianças e adolescentes, pois, além do efeito restaurador, estabelece a fixação das aprendizagens. Aprendizagens estas que, se colocadas em uso e acionadas continuamente, em diferentes situações, consolidam-se em habilidades e competências.

No entanto, se a informação cair em desuso ou não passar por processos de fixação, ela cai no esquecimento. É o que ocorre quando ao aluno estuda para a prova, decorando conceitos para reproduzi-los e esquece tudo logo em seguida. Isso mostra que não houve aprendizagem, visto que o cérebro considerou a informação de pouca relevância, pois não foi usada continuamente e, portanto, não foi fixada. Aqui vale sugerir o filme ‘Divertidamente’ que esclarece perfeitamente estes processos!

Bem, a pandemia comprometeu todos estes processos pois reduziu a exposição a estímulos variados, não garantiu em muitas realidades a sistematização das informações recebidas, pouco possibilitou o uso de diferentes informações em diferentes contextos e isso já gerou o comprometimento das aprendizagens.

Educação-Ensino-Aprendizagem

Afinal, para aprender bem os alunos precisam de tempo para armazenar memórias de longo prazo, repetição pelo uso de diferentes estratégias para fixar as aprendizagens, motivação para o aluno demonstrar esforço rumo ao alcance dos objetivos de aprendizagem, personalização do ensino para que o professor possa acompanhar o desempenho do aluno, por meio de evidências de aprendizagem variadas reveladas pelo aluno e a partir daí decidir pelas ações mais assertivas para a aprendizagem e investir na problematização para ajudar o aluno a desenvolver hipóteses a partir dos estímulos recebidos.

Os tempos de pandemia também comprometeram estes processos, além do que, gerou um afastamento do professor em relação aos seus alunos e isso também impactou a aprendizagem, pois a relação próxima entre aluno e professor permite a demonstração de interesse por parte deste segundo e as expectativas do adulto em relação ao aluno também influenciam seus processos de aprendizagem, inclusive podendo modificar o cérebro do aluno.

Feedbacks positivos que reforçam as conquistas ou construtivos que mostram o quanto os objetivos ainda não foram atingidos e veem o erro como elemento construtivo, como obstáculo a ser superado, contribuem muito para estimular a reflexão sobre o processo de aprendizagem do aluno, sobre sua metacognição, isto é, sobre sua forma de aprender e compreender como aprende e, assim, se necessário, rever suas estratégias para aprender.

No que diz respeito aos estímulos, às sinapses, não podemos nos esquecer da importância das funções executivas e aqui destaco a atenção! O quanto a atenção, o foco e a concentração ficaram comprometidas nos tempos de pandemia! Nossos alunos, na maioria das vezes, com câmeras desligadas, quando conectados, intensificaram seu perfil multitarefa, característico dos adolescentes: ouviam música, jogavam videogame, assistiam séries e até dormiam, “tudo junto e misturado”, enquanto a aula acontecia! Como aprender se sabemos pelos conhecimentos da neurociência que não dedicamos todo nosso potencial quando fazemos várias coisas ao mesmo tempo e isso, claro, compromete a qualidade da aprendizagem!

Enfim, agora precisamos resgatar no cotidiano da escola, o desenvolvimento de estratégias variadas que trabalhem a atenção tão necessária à aprendizagem! Inúmeras são as possibilidades, algumas delas podem envolver: atividades que envolvam estabelecimento de relações e associações como por exemplo, fazer conexões com conhecimentos prévios; oferta de novidades conceituais que despertem o interesse do aluno; propostas que envolvam alguma movimentação dos alunos a cada 20 minutos, tempo máximo de foco dos alunos maiores, por exemplo, troca de base no uso da rotação por estações, metodologia ativa muito interessante; uso de recompensas a cada avanço na aprendizagem, enfim, atividades contínuas e que favoreçam a sistematização e diagnóstico das aprendizagens e/ou dificuldades.

Olhar para o futuro

A partir desta breve retomada de como aprendemos, gestores e professores precisam rever suas concepções de planejamento e partir para um novo olhar para seus planos de trabalho. É preciso começar pelo fim, isto é, pelos objetivos. Quais objetivos são essenciais para a aprendizagem do aluno? Para isso, é preciso redesenhar o currículo escolar, de modo a priorizar as habilidades e competências da BNCC para aquela fase do desenvolvimento.

Neste processo de reorganização dos planos, compete a nós, educadores, adotarmos também um modelo de avaliação contínua e diagnóstica a partir do qual possamos identificar os domínios e dificuldades dos alunos para redimensionar a rota de trabalho, a escolha de estratégias e recursos para a aprendizagem.

Ensino-aprendizagem

Neste redesenho do plano que envolve a revisão curricular e a avaliação diagnóstica, é imprescindível uma intervenção pedagógica proativa que redimensione os tempos de trabalho, o uso dos recursos e estratégias e promovam a criação de agrupamentos de alunos de acordo com seus perfis ou necessidades de aprendizagem, assim como promover a personalização de propostas de trabalho que atendam aos diversos níveis de aprendizagem e incentivar, também, o desenvolvimento de tarefas como momento de sistematização.

Nesse novo desenho, o conteúdo passa a ser meio para o alcance dos objetivos e assim garantimos não só a aprendizagem conceitual, mas a procedimental e a atitudinal, pois as estratégias escolhidas contribuirão com o desenvolvimento de habilidades operatórias e ao pensarmos nas atitudes que pretendemos desenvolver, tendo em vista o desenvolvimento integral do aluno, trabalharemos o desenvolvimento socioemocional a partir do conceito e das estratégias escolhidas e, assim, as competências socioemocionais previstas na BNCC também serão desenvolvidas de modo articulado com o conteúdo.

Tudo isso colocado até aqui, caracteriza o processo de recomposição da aprendizagem como uma resposta para tratarmos das defasagens acumuladas e, por isso, deve ser um processo conjunto entre professores e gestores que devem trabalhar juntos, numa atitude de responsabilidade compartilhada para alavancar a educação do país.

Não podemos nos esquecer de que as famílias também devem estar inseridas neste processo, na medida em que devem estar esclarecidas sobre o propósito do trabalho da escola. Devem ainda ser incentivadas a valorizar a educação e, para isso, devem ser convidadas a estar sempre próximas à escola, vendo-a como espaço de diálogo de modo que juntas possam pensar ações complementares ao espaço escolar para reduzir as dificuldades de aprendizagem e ajudar os alunos a resgatarem hábitos de estudo.

Por certo este conjunto de ações nas diferentes instâncias poderão contribuir com um novo painel na educação do país e, assim, contribuir com o desenvolvimento da formação integral do aluno rumo a um cenário a cada dia mais exigente em que se espera dos egressos da escola, criatividade, capacidade para a resolução de situações problema, abertura ao novo, comprometimento e competência social.

O desafio não é pequeno, mas nós poderemos vencer, assim como fizemos nos anos de pandemia em que nos reinventamos num curto espaço de tempo. Para isso, precisamos ter objetivos claros, disposição para uma prática docente diferenciada, abertura para aprender mais a cada dia e contar com uma equipe gestora parceira, responsável e comprometida!

Sobre a autora:


*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Bett Brasil.

Artigo publicado originalmente na Revista Escola Particular.

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