O Enem e o novo Ensino Médio
O presidente do Inep, Manuel Palácios, em recente entrevista ao jornal Estado de São Paulo, destacou questões importantes acerca das mudanças do Enem a partir de 2024. Ressaltou que a primeira etapa do exame deverá avaliar a formação geral básica obrigatória, tal como previsto nas Diretrizes Nacionais do Novo Exame Nacional do Ensino Médio, aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação (Parecer CNE/CP no. 5/2022). Indicou também que a segunda etapa do exame, ou seja, a avaliação referida aos itinerários formativos da parte flexível do novo ensino médio, deverá ser discutida com as secretarias estaduais, escolas particulares e universidades.
A questão central, segundo o presidente do Inep, é que a escolha do itinerário não seja um definidor da carreira pretendida pelo estudante no ensino superior. Por exemplo, um estudante que opte pelo aprofundamento na área de Ciências Humanas poderá ter interesse em conseguir uma vaga na área de Ciências da Natureza ou Matemática e suas tecnologias. Outro que opte por um itinerário técnico profissional na área da saúde poderá ter interesse em conseguir uma vaga num curso de economia ou engenharia, e assim por diante. Trata-se de um ponto relevante que tem sido objeto de debates entre especialistas, professores e gestores da educação básica e do ensino superior.
As discussões travadas no Conselho Nacional de Educação (CNE), ao longo de 2020 e 2021, acerca do futuro do Enem e do seu alinhamento ao novo ensino médio envolveram professores, gestores e especialistas em currículo e avaliação de diferentes instituições do país.
Houve consenso acerca da primeira etapa do exame com foco na avaliação da formação geral básica, a partir de uma abordagem interdisciplinar das quatro áreas de conhecimento – Linguagens e suas tecnologias, Ciências Humanas e suas tecnologias, Ciências da Natureza e Matemática e suas tecnologias, uma redação e uma prova específica de língua inglesa (que, infelizmente, não foi aceita pelo grupo de trabalho do Ministério da Educação - MEC).
Em contrapartida, não houve consenso sobre a avaliação dos itinerários formativos. De acordo com o CNE, a segunda etapa de avaliação dos itinerários de aprofundamento das áreas, de livre escolha dos estudantes, deveria constituir-se por provas específicas alinhadas às carreiras (saúde; matemática e engenharias; ciências sociais aplicadas; e, Linguagens e Ciências Humanas), tendência observada em sistemas de seleção de acesso à educação superior em diferentes países.
A decisão final, aprovada pelo grupo de trabalho do MEC e pelos secretários estaduais de educação, estabeleceu nova proposta e quatro possibilidades de exames de livre escolha dos candidatos: a) Ciências Humanas e Linguagens; b) Ciências Humanas e Ciências da Natureza; c) Ciências Humanas e Matemática; d) Ciências da Natureza e Matemática e suas tecnologias. Contudo, ambas as propostas buscaram alinhar o formato da segunda etapa do Enem às escolhas futuras dos estudantes nos cursos superiores, como estabelece a legislação.
O presidente do Inep levantou questões relevantes sobre a avaliação dos itinerários e manifestou a necessidade de discutir o formato da segunda etapa do Enem, proposta pelo MEC. O exame deveria avaliar o estudante independentemente do itinerário cursado e das suas escolhas futuras no nível superior, com ênfase na avaliação das competências requeridas num mundo em profunda transformação.
Não há dúvida de que os exames devem avaliar competências, como criatividade, pensamento crítico, capacidade de argumentar e de relacionar informações confiáveis de diferentes fontes, resolver problemas de modo colaborativo, que são estruturantes da BNCC, referenciam todos os itinerários e as áreas de conhecimento.
Mas também é verdade que as competências das áreas, integradas ou não, são desenvolvidas a partir dos conhecimentos e habilidades adquiridos nos itinerários de aprofundamento acadêmico. Como seriam avaliados os diferentes itinerários? Qual o formato de avaliação dos itinerários que integram a parte flexível dos currículos?
É urgente, portanto, retomar a discussão acerca do desenho da segunda etapa do Enem ou da avaliação dos itinerários, uma vez que a implementação do novo ensino médio se iniciou no ano de 2022 e todas as escolas do país aguardam ansiosamente uma definição para orientar seus milhares de estudantes.
Eis um bom desafio. A boa notícia é ouvir a disposição do presidente do Inep e dos dirigentes do MEC em aprofundar a discussão e buscar uma solução, mesmo que transitória, para o novo Enem.
Sobre a autora:
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Maria Helena Guimarães de Castro
Presidente da ABAVE (Associação Brasileira de Avaliação Educacional)
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Bett Brasil.
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