Bett UK

22-24 Jan 2025

Bett Brasil

28/Abr a 01/Mai 2025

Bett Asia

1-2 Out 2025

Bett Blog

12 fev 2025

Formação docente precisa de mais conexão com a prática

Redação Bett Blog
Formação docente precisa de mais conexão com a prática
Foto: Bruno Peres/Agência Brasil
Especialistas defendem que a solução passa por um modelo de ensino mais dinâmico, que prepare os docentes para os desafios reais do ambiente escolar, além de políticas públicas que garantam melhores condições de trabalho e reconhecimento profissional

A valorização da carreira docente é um dos desafios para a Educação no Brasil. Apesar de iniciativas, como o recém-lançado programa ‘Mais Professores’ do governo federal, a profissão ainda enfrenta baixa atratividade, salários pouco competitivos e uma formação que carece de maior conexão com a prática em sala de aula.

A fundadora e diretora da Faculdade da Educação (Feduc), Rosemary Schettini, avalia que a formação inicial de professores necessita de uma profunda reavaliação. Para ela, a formação docente ainda está excessivamente focada na teoria, com pouca aplicação prática, o que compromete a preparação dos futuros educadores.

"Um professor precisa ter uma visão de mundo ampla, capaz de estabelecer relações e criar um ambiente de aprendizagem enriquecedor. No entanto, essa não é a nossa realidade”, comenta.

Rosemary analisa que a origem socioeconômica dos estudantes que ingressam nos cursos de licenciatura é um fator que impacta na formação. Ela afirma que as melhores práticas de formação docente ainda estão concentradas nas universidades públicas, que recebem majoritariamente estudantes provenientes de escolas privadas. No entanto, a maioria dos ingressantes nos cursos de licenciatura vêm de famílias de menor renda, cursam faculdades privadas no período noturno ou na modalidade de ensino a distância (EaD). 

“Esse contexto impõe um empecilho para a formação acadêmica voltada para a prática. Isso porque, a exigência da carga horária mínima de estágio obrigatório se torna um obstáculo, pois as escolas – locais onde o estágio deve ocorrer – funcionam durante o dia, justamente no horário em que a maioria desses alunos estão no mercado de trabalho”, diz a diretora da Feduc.

Outro ponto crítico, segundo a educadora, é a valorização da profissão. "Os professores lidam com baixos salários, condições precárias de trabalho, superlotação das salas e até violência nas escolas. Essa desvalorização afasta os jovens da carreira docente e compromete a qualidade do ensino", afirma.

A baixa atratividade da profissão também é um ponto de preocupação do titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados da USP de Ribeirão Preto, Mozart Neves Ramos. Assim como Rosemary, ele ressalta a importância de conectar a formação inicial à prática docente desde o início do curso, com um modelo mais próximo da realidade da sala de aula.

Além disso, Ramos aponta que grande parte dos ingressantes nos cursos de Pedagogia apresenta dificuldades acadêmicas desde a base, evidenciadas pelo desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Muitos desses estudantes não alcançam sequer 450 pontos na prova, pontuação mínima que, na prática, indicaria a conclusão satisfatória do Ensino Médio. Apesar dessas deficiências, ingressam no Ensino Superior, levando consigo lacunas de aprendizado que comprometem sua formação como educadores.

“É impossível garantir um ensino de qualidade no país sem professores bem preparados e valorizados, uma vez que o docente é o fator intraescolar mais determinante para o aprendizado dos alunos”, pontua o titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do IEA-USP.

Residência pedagógica na formação de professores?

Para Rosemary, é necessária uma transformação curricular significativa, incluindo a adoção de um modelo de residência pedagógica.

“A adoção de um modelo baseado na residência pedagógica implica mudanças como convocar os estudantes a refletirem de maneira contínua sobre as particularidades, desafios e dinâmicas do ambiente escolar, garantindo que sua formação esteja alinhada às demandas reais da profissão. Além disso, os futuros professores precisam de um processo de mediação que os ajude a migrar gradualmente do papel de aluno para o de profissional da educação, proporcionando-lhes experiências concretas e orientadas dentro da escola”, diz.

Ela explica que é fundamental que os estágios sejam integrados ao currículo da instituição formadora de maneira orgânica e estratégica. “O estágio deve ser compreendido não como um elemento periférico da formação, mas como um eixo central, funcionando como o tronco de sustentação do aprendizado prático. No entanto, essa preocupação ainda não foi abordada de forma consistente no Brasil”, afirma.

Formação docente na educação

Valorização da carreira docente é um dos desafios no país. Foto: José Cruz/Agência Brasil 

Outro grande problema, segundo a diretora da Feduc, é a falta de acompanhamento e supervisão adequada dos estagiários. “Atualmente, muitos estudantes realizam estágios sem receber qualquer tipo de feedback contínuo, o que impede um aprimoramento real de sua prática docente”, acrescenta.

Além disso, Rosemary aponta outras áreas que precisam de atenção para a valorização da profissão. "É essencial melhorar a gestão educacional ao reduzir a burocracia, combater a violência nas escolas para criar espaços mais seguros e oferecer suporte emocional aos professores. O estresse e a pressão enfrentados pelos docentes são enormes e um ambiente mais acolhedor poderia fazer a diferença", conclui.

Programa ‘Mais Professores’ do MEC

Em janeiro, o Ministério da Educação lançou o programa ‘Mais Professores’, que reúne um conjunto de ações pensadas para a valorização da carreira dos docentes no Brasil. Entre as iniciativas está o Pé-de-Meia Licenciaturas, que oferece um benefício mensal de R$ 1.050 para os estudantes que ingressarem em cursos de licenciatura pelo SISU, PROUNI ou FIES Social.

Sobre o programa federal, Neves comenta que a iniciativa merece reconhecimento e é um ponto de partida para uma mudança na percepção do jovem pela carreira do magistério. Porém, é fundamental que o MEC compreenda que essa ação, por si só, não será suficiente para solucionar o problema.

Ele sugere que um dos caminhos essenciais para fortalecer a valorização docente seria a criação de um plano nacional de carreira para os professores formados nesse novo contexto. O plano poderia se inspirar no modelo do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), garantindo financiamento contínuo e políticas consistentes para remuneração e progressão na carreira.

Leia também:

Além disso, o MEC poderia investir em incentivos para os cursos de licenciatura oferecidos por instituições particulares de ensino reconhecidas como de alta qualidade pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Atualmente, essas instituições enfrentam dificuldades para competir com cursos de licenciatura a distância ofertados por valores simbólicos, como R$ 99,00.

Mesmo com o aumento no número de inscrições de estudantes com alto desempenho no Sistema de Seleção Unificada (Sisu) para cursos de licenciatura divulgado pelo MEC recentemente após o anúncio do ‘Mais Professores’, Rosemary acredita que a oferta para a contratação de mais profissionais pode ser parte solução, mas não resolve os problemas estruturais da formação docente.

Ela opina que esse tipo de programa é importante para oferecer mais segurança financeira aos professores ao longo de sua trajetória profissional, porém não aborda diretamente a qualidade da formação inicial ou continuada dos profissionais da educação.

"Não basta ter mais professores, é preciso garantir uma formação de qualidade. Sem programas robustos de qualificação na formação inicial e continuada unida à criação de políticas de incentivo, melhores condições de trabalho e salários, a atratividade da carreira docente continuará sendo um problema", argumenta Rosemary.

A diretora da Feduc também critica a nomenclatura do programa de incentivo financeiro do governo. "A expressão 'Pé-de-Meia' já carrega um significado que não valoriza a profissão. Prefiro chamar de auxílio para formação ou bolsa permanência, pois isso reflete melhor a necessidade de apoio aos estudantes durante sua trajetória acadêmica", conclui.

Compartilhe nas redes sociais:

Categories

  • Gestão Educacional
Voltar ao Bett Blog
Loading