Reggio Emilia: uma escola que atende à educação e aos princípios de assistência social
A escola de Reggio Emilia, que tanto sucesso está fazendo no Brasil, é uma abordagem educacional que nasceu de um grupo de mulheres feministas. Uma escola que se ergueu com restos de guerra deixados pelos alemães ao final da segunda guerra. Só isso já explica uma parte da história que essa escola construiu.
Essa experiência de escola está pautada na luta de pais e mães, sobretudo das mães trabalhadoras. Uma escola que atende princípios de assistência sociais, ao mesmo tempo que atende educação. Uma escola que tem participação efetiva de pais. Uma escola cuja formação acontece em serviço. Uma escola cujas lideranças têm papel social e naquele contexto trabalham.
Reggio não é só uma escola onde há documentação pedagógica, contextos investigativos, atelierista e pedagogista. Essa experiência de educação infantil está conquistando educadores do mundo inteiro.
No Brasil, está cada vez mais forte a procura por informações e formações com essa orientação pedagógica, porque ela coloca a criança como protagonista de suas aprendizagens.
O que acontece na prática
Na prática de sala de aula, por exemplo, eu encontrei pregos, cacos de vidros, arames, tesouras com pontas, canetas com tampas que se desprendem. Ao ser perguntadas sobre o perigo desses elementos para a segurança dessas crianças, as pedagogistas de Reggio responderam com olhar do tipo: em que mundo as crianças com as quais vocês trabalham vivem? A resposta foi uma provocação que muitas educadoras brasileiras presentes na formação não conseguiram entender.
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Elas não entenderam que no lugar do perigo que elas vêem para as crianças, as educadoras italianas veem oportunidade, no lugar das restrições, as educadoras italianas veem contextos reais da vida. As educadoras brasileiras ficaram, naquela ocasião, com a sensação de que as educadoras italianas não cuidavam o suficiente das crianças ou que não davam a elas a proteção que as educadoras brasileiras davam.
A criança nesse processo educacional
Reggio traz a criança verdadeiramente para o lugar do protagonismo de sua história. Tem apoio e condução de uma pedagogista (educadoras para nós brasileiros), mas é a criança a autora de sua própria formação. A criança pode desenvolver projetos de identificação própria. Pode fazer isso sozinha, com um amigo, com uma dupla, trio ou em outro formatos de grupos.
Reggio dá liberdade e, ao mesmo tempo, constrói essa liberdade com as crianças. Reggio dá oportunidade e, ao mesmo tempo, faz essas oportunidades se plasmarem diante da criança e dá ainda o poder de condução à criança.
Nós, pais e educadores no Brasil ainda não conseguimos abrir mão da aula expositiva, das carteiras enfileiradas e dos manuais, livros didáticos, que tanto reduzem o mundo da criança e coloca a criança somente numa parte dele. À criança, Reggio dá o mundo inteiro e as rédeas dele. As crianças sentem-se livres para isso.
Ateliê de chás preparado para mostrar aos educadores como pode ser feito o trabalho na prática
A escola de Reggio não tem playground cheios de brinquedos de plásticos coloridos. No lugar disso, seus pátios externos são vazios. Um pouco de grama ou não, árvores, terra e alguns poucos brinquedos já estruturados em madeira. De resto é um grande espaço em branco, vazio, onde as crianças podem preencher com a imaginação.
A forma de avaliar o aluno
Há uma dimensão muito importante em Reggio que é a documentação pedagógica no lugar de boletins de notas, portfólios ou avaliações estruturadas em perguntas para serem respondidas.
A documentação pedagógica é de fato uma documentação. Parecida com uma peça jurídica, a documentação traz, dia a dia, as informações dos passos da criança. Como a criança se comportou a fazer escolhas e como não aconteceram as escolhas que eram esperadas para aquela criança.
A documentação pedagógica permite um olhar longitudinal na trajetória de uma criança até aquele ponto. É justamente esse olhar longitudinal que permite, ao educador, avaliar e perceber o que falta, o que repor, o que trazer e o que repartir dessas crianças entre os seus pares de caminhada. A documentação pedagógica, talvez, seja a parte mais encantadora desse projeto educativo.
Os benefícios para a família
As famílias ganham muito diante de uma prática como essa, pois é com essa documentação que os pais podem, assim como os educadores, perceber o direcionamento a que o filho está tomando.
A missão
As escolas de Reggio têm uma importante missão para os educadores: mostrar a importância de um educador motivado, amando o que faz e imerso no contexto da sala de aula.
A vontade do educador é o grande poder transformador de uma sala de aula. Ele é o sujeito da projetação. É essa projetação que acontece nas escolas de lá que não acontece no Brasil. Ao fazer uma projetação, alunos e professores estão no mesmo barco. O barco das descobertas.
Sobre o autor:
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Geraldo Peçanha de Almeida
Pedagogo, psicanalista, mestre em Teoria Literária e doutor em Crítica Literária
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Bett Brasil.
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