A inclusão escolar precisa entrar em uma nova fase de discussão
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Definitivamente, não há uma só inclusão. Nem no mundo, nem no Brasil. Mas vamos falar do Brasil. Até aqui, o Brasil já fez uma boa parte (o que não quer dizer que já fez tudo) da tarefa de casa em relação à inclusão: estabeleceu uma política mínima de auxílio e proteção às pessoas com deficiências; elaborou, aprovou e sancionou leis nas diferentes esferas que protegem e amparam direitos mínimos a PCDs; além disso, garantiu recursos tanto para atendimentos e medicamento via SUS – este último ainda precisando de ajustes e mais investimentos.
Ninguém pode negar que o Parecer 50, do Conselho Nacional de Educação, forneceu um norte de trabalho para o processo de inclusão escolar nas escolas, coisa que até pouco tempo atrás também não existia. Porém, é hora de revisar toda a política em torno da ideia que o Brasil levantou sobre inclusão. Ela já está obsoleta. Ela precisa ser revista.
O primeiro ponto é financeiro. Há importantes estudos que mostram a soberania de políticas e investimentos na área de autismo, por exemplo, em relação às demais deficiências. Vale lembrar aqui que essa área, no sistema público, está acoplada aos tratamentos de saúde mental feitos pelos CAPS distribuídos pelo Brasil.
No caso dos CAPS, eles devem atender todas as demandas de saúde mental, inclusive de autismo. Porém, a reclamação dessas instituições é que o grande investimento está sendo feito somente em TEA, enquanto as demais áreas de saúde mental carecem de recursos e estão sendo esquecidas. Há números assustadores sobre esses fatos.
O segundo ponto é que, somente no Congresso Nacional, entre 2023 e 2024, o número de projetos de lei acerca do autismo supera as demais áreas, em números estarrecedores também. Ou seja, por um lado isso é visto como uma prática positiva, resultado da cobrança da sociedade. Por outro, mostra que o Congresso Nacional não está trabalhando com todas as demandas do país, mas apenas com aquelas que, neste momento, têm maior repercussão de mídia. Nas esferas estaduais e municipais, não há estudos publicados ainda, mas, dada a situação federal, presume-se o mesmo fato.
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O terceiro ponto são os planos de saúde que já demonstram esgotamento nesses atendimentos. Há uma judicialização sem tamanho em torno do tema. Pais entram na justiça por todo o Brasil para conseguir um atendimento aqui e acolá. Essa prática mostra que tem algo que não está encaixado – se os pais pagam os planos para terem atendimentos de seus filhos, por que esses mesmos pais ainda precisam recorrer à justiça para terem esses atendimentos? O descompasso entre o que é necessário e o que está sendo ofertado é visível, e algo tem que ser feito urgentemente.
E, por fim, há as diferenças do Brasil gigante. Falar de uma só inclusão para um país de dimensões continentais não dá mais. Não adianta ter leis que garantam atendimentos terapêuticos e escolas especializadas aos alunos com deficiência se, lá na ponta, no local onde essas crianças vivem, não há profissionais nem serviços disponíveis.
Não tem como fazer com que um terapeuta ocupacional, um psicólogo e um fonoaudiólogo estejam disponíveis em cada canto do Brasil para atender com qualidades essas necessidades, se não há nenhuma política nacional de formação e incentivo para essas áreas e profissionais.
Hoje, falamos em inclusão como se todas as escolas do Brasil tivessem professores especializados, professores auxiliares, salas de recursos e materiais adequados. Não podemos nos esquecer que, em muitas localidades do Brasil, nem a escola há. Não há materiais. Não há esses profissionais, mas há alunos com deficiência. E daí, como fazer?
O discurso unificador só atrapalha e traz retrocesso a um processo que poderia ser múltiplo e rico, mas que está sendo reduzido a três ou quatro terapias que “dizem” ser as certas e com comprovações cientificas, quando, na verdade, há infinitas possibilidades de atendimento digno à criança com deficiência e ao jovem com deficiência.
Mas, para percebermos isso, temos que abrir novas discussões em torno do tema. Inclusão é multiplicidade. Inclusão é diversidade. Inclusão é diferença. Inclusão são respostas – no plural. Não há singular no processo de inclusão. Somente o plural nos serve neste momento.
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*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Bett Brasil.
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